quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Rascunho 1

"Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco".

Os olhos suportam tudo
passivos de não mais querer
cientes do não mais haver
Os olhos alheios ao mundo
O mundo

Os olhos carregam o mundo
carregam o que não sobrou
a sobra que não ficou
Os olhos carregam o haver nos olhos

o haver das palavras não ditas
o destino das promessas esquecidas
Os olhos?
Os olhos não veem.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Meu lado mulherzinha

Quem não tiver, que atire a primeira pedra.

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Todo mundo se apaixona distraidamente. É coisa que não se decide e só é percebido quando já está em flor.

“Como você o conheceu?”

É a primeira pergunta da saga. Foi-se o tempo em que se tinha vergonha de dizer que conhecemos pessoas pela internet. Pode ser gastando horas entrando e saindo em salas de chat, visitando um perfil de Orkut por curiosidade, retribuindo um comentário que chegou no blog ou fotolog. Não importa tanto. Quer dizer, importa sim. Se foi muito por acaso, a apresentação ganha um peso mágico para os outros, inclusive para você, que conta como foi cheia de orgulho, dizendo que ele nem pediu o MSN logo de cara, como se isso fosse um baita sinal de respeito.

“Cê ta gostando dele?”

A resposta é sempre evasiva, um “Eu?! Nãao...” que não convence ninguém, sempre seguido de um “sei... e ele?”. Pronto. É uma verborragia sem fim. Todos os achismos e as benditas e traiçoeiras expectativas explodem na boca num fôlego só. Você cita cada mensagem de MSN, cada torpedo [não importa se ele era um resmungo sobre a vida ou algo que te diz respeito], cada ligação. Cada palavra é cuidadosamente [e geralmente erroneamente] analisada, decifrando querências que podem existir pro trás das virgulas. Sempre na defensiva, claro. É o nascimento e fixação dele no seu mundo.

“Como foi?”

Você pode contar de forma afobada, engasgando nas próprias palavras, cortando várias coisas que vai contar depois. Pode falar “foi per-fei-to” umas 50 vezes antes de começar a contar [ou no meio da estória... ou no fim... ou o tempo todo, o que é mais provável], fazendo aqueles sons estranhos que não são nem suspiros nem exclamações humanamente conhecidas. Gesticula feito uma doida, quase quebra o maxilar de tanto sorrir. Não sei como os meninos contam essas coisas [Se é que contam. Já ouvi um me dizer que o relato se resume a “To pegando uma mulezinha aí...”. Meninos... blé.]. Muitos acham um absurdo sabermos tanto umas das outras. Mas é fundamental! É como ler o livro depois de ver o filme. E é como conseguimos buscar melhor a aceitação/aprovação das melhores amigas. Sim, nós buscamos isso e o contentamento compartilhado é necessário. É o ele existir pacificamente no seu mundo.

“Já tem quanto tempo mesmo?”

Contam-se os segundos. Você pode vê-lo todos os dias, semanalmente ou quinzenalmente. Não importa. Ingenuamente a seriedade da relação [para você!] está ligada a quanto tempo a coisa vem acontecendo, como se fosse plano de carreira. Tenta definir o “o que ele é meu, afinal?” Ah, e, claro, obviamente você também quer saber o que é para ele, até onde vai na vida dele, se existe além da cabeça dele, como para familiares e amigos. Enfim, tudo que envolver os pronomes “você” e “dele” se torna alvo da sua desesperada, incontrolável, praticamente [praticamente é só um eufemismo] insana curiosidade. Mas é um ponto tão obscuro e temeroso pra se pensar que às vezes nem suas amigas sabem dos seus temores [Pode ser que você continue sendo “a mulezinha que ele ta pegando”]. Óbvio que não assumimos a dúvida, mesmo que todos saibam. Gritamos “Ele não é meu namorado! Eu não estou namorando!” com um desejo gigante de que fosse mentira. É a eterna e inútil autodefesa. A essa altura certamente você já pensa até em nomes para os filhos...

“Como vocês estão?”

A pergunta deveria ser “Como você está?” e a resposta oficial é “Indo...”. Para as amigas é “Na merda!”. Para as que têm a infelicidade de se apaixonarem pelos que têm problemas em deixar claro o que querem [É uma boa tática, sabe? Se ele não promete nada, você não pode cobrar nada. Coisas que nunca aprenderemos a fazer. A habilidade não vem no cromossomo X], esse é o ponto crítico. O celular vira um extensão do corpo. Temos alucinações auditivas; ouvimos o som de sms chegando, ou de um contato ficando online no MSN. Se é o caso de aguardar uma visita ou qualquer forma de comunicação prometida, emails são checados a cada 10 minutos, MSN a cada 5 e celular a cada 2. O tempo também pode ser medido em segundos, dependendo da gravidade da saudade. A parte incômoda é que você se torna extremamente improdutiva. O dia para. Até a respiração fica meio suspensa. É uma espera eterna pela hora que ele costuma ligar ou dar um mísero oi. Até lá a concentração nas coisas beira o zero. E quando ele não aparece, a saudade vira desapontamento que vira tristeza que vira raiva que vira ódio e a partir desse ponto você já adquiriu uma úlcera e nem se deu conta. Isso em milésimos de segundo - enquanto você se descabela, ele está estudando, trabalhando, rindo com os amigos, ensaiando, dormindo... fazendo qualquer outra coisa. Pode até estar pensando em você, mas nessas coisas a nossa mente doente nunca pensa, mais fácil [e mais provável] é que ele esteja se esbaldando na esbórnia nem lembrando de que você existe. Daí você pensa em tudo que quer dizer quando ele aparecer no tom certo pra mostrar a indignação, em como ele estragou seu dia. E quando ele aparece... instantaneamente o mundo volta ao lugar e você fica em paz.

“Decidiu o que?”

Se a coisa está empacada, você precisa ouvir isso daí algumas vezes pra ajudar. As variações de humor ficam mais constantes. Você chora com filmes de cachorros, comerciais de cartão de crédito ou de plano de saúde [como aquelas pessoas podem ser tão felizes?!]. Imagina como seria pedir uma definição, pensa em todas as respostas que ele pode dar e em todas as réplicas que você pode revidar. Jura que não vai chorar quando já está chorando convulsivamente apenas por pensar em como resolver a situação. Com um pouco de sorte, você pode constatar que fez uma tempestade numa xícara de café [copo de água é grande demais]. Sem sinal dela, bem... é chorar um pouco [mentira, você chora até secar] e entrar de luto em todos os espaços reais e virtuais, amaldiçoando a internet por ter trazido a tragédia pra sua vida, ainda com uma esperança estúpida de que ele vá acessar algum pedaço do seu mundo em ruínas e tentar te procurar. E depois de umas semanas, ou dias, com sorte, apertar o F5 para atualizar tudo e retomar a vida.

Por Cíntia Rodrigues - com a colaboração de Lívia Dias.

sábado, 2 de maio de 2009

Entre as vírgulas

"a saudade fará mais por nós dois que nosso amor e sua
desajeitada e irrefletida permanência"

terça-feira, 10 de março de 2009

Notas inconclusas

Juntei os pedaços de vida que ficaram espalhados pela casa desde sua partida. Uni aos caquinhos de mim e fiz um belo arranjo. Não é tão belo quanto aquele que você, num momento insano e estúpido, atirou pela janela,mesmo sabendo que era o meu favorito, que eu cautelosamente decorei ao longo de nossa convivência. Não é tão bonito. Meio desajeitado,eu diria.
Pensei em ir até o jardim, resgatar os pedaços mais belos daquela pequena ruína para juntar ao meu singelo arranjo e tentar dar-lhe mais cor. Mas o que tinha de mais bonito era justamente o que estava mais estilhaçado, infelizmente, nada vai colar.
Chorei. Tive raiva. Desisti do projeto.
Pensei no que iria fazer com aquilo, não podia jogar fora, simplesmente. Então peguei o desajeitado arranjo e fui colando os pedacinhos sobre seu retrato. No entanto, os meus pedaços não foram suficientes para encobrir de todo sua face, ficaram menos que a metade. Você levou muita coisa.
Foi então que resolvi ir lá fora buscar outros pedaços, novas cores para restituir aqueles caquinhos e concluir meu novo projeto.
Quem sabe, aos poucos, peça a peça, eu consiga apagar seu rosto por completo daquela moldura? Quem sabe não faça arte com minha preciosa sucata?
Pode ser que não fique uma figura plana e bem definida como a de antes, mas pode dar um bonito mosaico.

domingo, 8 de março de 2009

Considerações ortográficas

Para C.

Eu sou a personificação da dúvida mesmo e você tem razão quando diz que isso se reflete até em minha pontuação, que é povoada por interrogações, raras exclamações e inexistentes pontos finais. É, os finais são os mais incertos.
E o que dizer das reticências? Deveriam me libertar um pouco né? Mas não.. elas não seguem ad infinitum, como deveriam ser. Até elas ficam hesitantes entre o ponto final e o continuativo. Não seguem em frente, param no meio..

quarta-feira, 4 de março de 2009

Irracionalidade

É negar a fatalidade de tudo isso. É cegar a razão e tudo de óbvio que ela vê e ignorar tudo que ela põe na minha frente.É ter total noção do auto-boicote das decisões tomadas em nome de um sentimento estúpido e burro.
É tudo isso e um pouco mais...

Mas esse coração imbecil teima em sentir sua falta.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Sobre planos não cumpridos

Olha só, você nem me levou ao Jardim Botânico.



P.S. O caso Watergate continua não fazendo o mínimo sentido pra mim.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O outro lado da força

Vez em quando me aparecem umas ideias que eu mesma não consigo acreditar que surgiram da minha cabeça de mulherzinha ciumenta, sujeita seriamente a casos de insanidade e histeria. Pois então. Num desses surtos de vaga sanidade, pensei em te deixar livre. Rá! Como assim!?!
Pois é, livre, assim mesmo, soltinho pra poder passear no puleiro que der na telha, escolher o canal chato de futebol e, quiçá, até as companhias que bem lhe aprouver - sim, mesmo aquelas intragáveis, que se passarem na minha esquina correm grande risco de levarem uma pedrada sem nem saber de onde veio. Simples assim.
Aposto que não ia acreditar, hein? Devia até fazer uma pegadinha contigo dia desses. Ia ser engraçado ver sua cara de total descrédito comprovando o fato de eu ser irremediavelmente chata. Como assim a ciumentaobssessivocompulsivainsuportavelmentegrudenta vai te deixar correr solto assim?!?
Pois é, pensei. Do nada mesmo. Estava sóbria até, juro. Pode esperar que daqui a pouco chegam os homens de branco, é camisa na certa.
Mas, pensando bem, até que a ideia não é má, o que é mais espantoso ainda.
A verdade é que eu tenho que parar com essa mania torta de achar que você é meu. Fazer o que? Eu acho mesmo. Quer dizer, eu sei que não é, mas acho que devia ser. Devia estar na constituição.
Contudo, não se desanime, isso ainda pode acontecer. O mundo está mudando e do jeito que ele anda girando e o aquecimento global tem causado coisas que nem Freud explica, não seria tão impossível não.
Daí depois a graça vai ser te roubar das outras. Vai entender... coisa de gente doida.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Momento reticente.

As reticências são os três primeiros passos
do pensamento que continua
por conta própriao seu caminho.
(Mário Quintana)

Um dia decidiu.
Foi até o quarto. Abriu suas gavetas. Pegou. Colocou em cima da cama.Pôs-se a dobrá-los. Eram a única coisa que lhe seria necessária.Foi até o guarda-roupas e, pondo-se na ponta dos pés, pegou uma pequena maleta.Voltou à cama, abriu a maleta e delicadamente colocou seus sonhos ali. Um de cada vez. Sonho a sonho. Era o que tinha de mais precioso.Olhou em volta, sua cama, a mesa de cabeceira que tinha acabado de decorar, as pessoas queridas no mural. Seus livros...
Respirou fundo e partiu.
Não deixou recado. Não contou a ninguém. Explicações seriam inúteis, quem lhe entenderia naquele mundo?Partiu. Simplesmente.
Um dia, enfim, tomou coragem e decidiu. Ia visitar o horizonte. E foi.

(se este  tem fim, com iria até lá, quando iria voltar, reticências que vão chegar) 



segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O avesso dos ponteiros

Na incansável ciranda dos ponteiros, todo dia é sempre agora.
Tudo irritantemente igual. t-o-d-o d-i-a.
Os dias, sempre assim, nem quente, nem frios. Mornos.
Nenhum trovão, um relâmpago, um raiozinho sequer. Uma explosãozinha ali no jardim do vizinho. Nenhum abalo císmico.
Nada que venha a tirar só um pouquinhosinho o mundo do eixo. Nada.
Só o mesmo tic-tac, tic-tac, tic-tac, mesmo, tic-tac,tic-tac, tic-tac, sempre.
O relógio nesse momento parece a todo instante mostrar a fadigante rotina a qual estamos fadados: girar em círculos para todo o sempre. Sem parar e, ainda assim, sem sair do lugar. Aguardando o momento de não sei o quê, que indique a tão esperada hora H. (O que existe de tão bom que comece com h?). Entretanto, o ponteiro não pára. E apesar desse constante movimento, não chega a lugar algum. Só serve para dar a infeliz ilusão de que se está caminhando, afinal, o tempo passa - pelo menos é o que o inútil objeto parace querer dizer.

Arre! Que vontade de que haja um grande estrondo que quebre as malditas vidraças desse relogio e que me faça sair desse claustro. A fobia já me quer dominar.

(onomatopeia pra começar enfim a vida.)

A quem interessar possa


Decidi fugir da vida pública, inclusive da sua. [da minha também]
Cansei disso aqui. Quero mudar, nem que seja só um pouco,ou por pouco tempo, já que mudança só se chama assim enquanto não nos acostumamos com ela. Ou, como costuma ser no meu caso, enquanto tudo não volte ao normal.
Por isso decidi mudar de caminho. Mas só vou ali dar uma espiadela no que é que tem por trás daquela portinha ali. Vou pular apenas uma página deste livro - só para poder ver se vem algo ali - mas volto logo para ler de onde parei.
É que me acometeu uma incontrolável curiosidade. Não sei bem o que é, mas não importa. Vou estudar essa sensação nova que cá dentro está.
Não, não se preocupe, não saio para explorar o vasto e perigoso universo lá de fora, não iria sem você. A novidade é aqui dentro. Quase como se houvesse um estranho dentro de casa.
Vou dar um pulinho ali em mim. Tenho certeza de que tudo voltará ao normal, mas me permito experimentar este acontecimento.
Afinal, se for para viver o mesmo, que seja o de daqui a pouco.
Já volto. Me espera.