sábado, 20 de setembro de 2008

Apenas devaneios

E, talvez, o mal que restou no fundo
da caixa de Pandora
não tenha sido o da Esperança.





Eu quero cantar a plenitude da vida, o “valer à pena” estar nesse mundo de loucos, a beleza de todas as coisas, a alegria dos amores não contrariados, correspondidos, satisfeitos não em si mesmos, mas no outro. Falar que, apesar de tantas veredas opostas, a da felicidade ainda está lá, intacta, certa, pronta para a chegada dos corajosos que acreditaram que o esforço era válido e pagaram o preço.
Não importa o que haja nesse caminho - até porque o meu estado de felicidade não corresponde ao estado pleno do outro, as pessoas não querem as mesmas coisas...
Porém, é neste momento que a caixinha de Pandora se abre, o conto de fadas encerra suas páginas e a cruel realidade se instaura com todas as suas leis, colocando meus pés no lugar de onde nunca deveriam ter saído.

É aí que me dou conta do motivo de todos os poetas serem tristes, e dos poemas tristes serem tão mais belos que os alegres e tão mais reveladores de verdades que custamos a crer. Do motivo das canções terem a maioria de suas letras falando mais do “destino dos amores contrariados” do que do “se fez indestrutível o nosso amor de tanto se erguer ferido” ou do “é bonita, é bonita e é bonita”. Porque da Guernica ser tão mais maravilhosa e tão mais impactante do que as idílicas paisagens de Monet.
Todos, sim, todos construíram seus lindos castelos e, muito pouco tempo depois, se deram conta de que estes estavam fundamentados em blocos de areia – só não os que cercaram de grandes muros os jardins de quem foram e, apesar da ventania, ainda acreditaram que se encontravam na segurança de seus cercados. E afinal, há que se perguntar para que serviu tanto sonho e tanta beleza. O que se fazer das magníficas ruínas?
A resposta parece simples, museus, poesia, arte (!): Tentativa de acreditar que o objeto do sonho ainda está lá, que é realmente válido, que de fato seria melhor se assim o fosse. “O poeta não fala de como a história acontece, e sim de como deveria ter acontecido”, já dizia Aristóteles. A arte, em todas as suas extensões, muitas vezes surge também como forma de lidar com a frustração, ou pelo menos de confidenciá-la. Transformar isso em algo belo, em história, em registro de pensamentos e costumes para a posteridade, esta foi a hercúlea tarefa dos grandes. Não que os artistas realmente o quisessem, mas é a explicação ou utilidade que dão para seus tão utópicos e ingênuos sonhos.
Tirando a vida do quadro e trazendo-na de volta para seu lugar, fico pensando no motivo de todas essas coisas, a fase da revolta ou da profunda tristeza foi substituída por apenas uma leve sensação de desconforto (na maioria das vezes. Admito que há recaídas vez em quando). Claro que o pensamento não serve em nada, apenas para incomodar mais. Mas a sensação que tenho é de estarmos todos num grande filme, cujos roteiristas são de extremo mau gosto ou, pelo menos de um humor muito peculiar. E penso que há alguns personagens que de fato tentam fugir do destino de seus papéis, ou tentam se rebelar contra seus criadores, mas tudo isso é também criação dos mesmos. Chega a ser cômico.
Enfim, concluo sempre estes tolos devaneios que não se pode fazer muita coisa mesmo, já que assim é, senão fingir que não se conforma e continuar brincando de fazer parte do filme. Volto aos livros, à Guernica e às canções. Uma forma de solidarizar-me com estes pobres magistrais. Compadeço-me e choro junto com suas dores, que também são as minhas. E brindo à arte, e vivo o sonho, e ainda o acho tão belo, ideal e necessário.
E o diretor mais uma vez ri.

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