quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Não por acaso (uma autobibliografia sem fatos)

porque eu era labirinto, e hoje, quando me sinto, é com saudades de mim. 
(sá carneiro, não por acaso, meu melhor amigo)


"A Decadência é a perda total da inconsciência; porque a inconsciência é o fundamento da vida. O coração, se pudesse pensar, pararia." (primeiro fragmento descoberto)


Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde me levará, porque não sei nada. Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cómodas até mim. Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero.

Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la, e não interrogo mais nem procuro. Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também.

"Conquistei, palmo a pequeno palmo, o terreno interior que nascera meu. Reclamei, espaço a pequeno espaço, o pântano em que me quedara nulo. Pari meu ser infinito, mas tirei-me a ferros de mim mesmo. 


Um dia, lá para o fim do futuro, alguém escreverá sobre mim um poema, e talvez só então eu comece a reinar no meu Reino."
(Bernardo Soares, meu livro do desassossego)
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 porque hoje eu quero que falem de protestos e falimentos por mim, porque há dias em que tudo nos cansa, até o que nos repousaria. 


Assinado Eu,
 eu mesmo...eu, cheio de todos os cansaços quantos o mundo pode dar.
 – Eu... Afinal tudo, porque tudo é eu, e até as estrelas, ao que parece...
(Fernando Pessoa)




Querido Jorge, acho que encontrei o Livro dos Livros. Sim, é o (meu) universo multi-hexagonal.

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