quarta-feira, 30 de março de 2011

Séria constatação da vida¹

"Não fugimos, por mais que queiramos, à fraternidade universal. Amamo-nos todos uns aos outros, e a mentira é o beijo que trocamos".


[262]
"Cheguei hoje, de repente, a uma sensação absurda e justa. Reparei, num relâmpago íntimo, que não sou ninguém. Ninguém, absolutamente ninguém".
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E ele, mais uma vez, acompanhando minhas dores. 


¹ Ao modelo Garota do Instante

domingo, 27 de março de 2011

sábado, 26 de março de 2011

Tudo sobre minha mãe.

Acorda com os olhos inchados.
- Que cara é essa? Passou a noite chorando? Que horas você chegou?
- Tarde.
- Brigou? O que aconteceu? Eu não sei porque vocês choram quando brigam. Eu nunca chorei quando brigava com teu pai. Ficar brigando por besteira e chorar. Ninguém merece isso. Ninguém. Vocês não aprendem.
- Não é isso, mãe..
- Eu não entendo vocês duas. Vocês tiveram oportunidade de serem livres, independentes, divertidas, criei vocês pra isso. Mas não, ficam aí chorando quando brigam.  Vocês não aprenderam nada comigo. Por que você não ficou? Por que você não foi embora sozinha? Melhor que brigar. Não tinha passado por isso e não tinha chorado.
- Não foi isso, mãe...
- Não entendo vocês duas. Ficam passando por isso. Não gostou? Vai embora. Ficar sendo submissa, tentar agradar. Ninguém valoriza isso, ninguém merece isso. Nem amigo, nem homem, nem família. Entendeu? Vocês não entendem. Vocês estudam, trabalham, mas não aprendem nada. Vocês não aprenderam nada comigo. Não entendo vocês duas.
- Não é isso, mãe.  Só tô triste, me deixa....
- Eu não entendo. Vai ser feliz! Podendo ser feliz fica aí perdendo tempo sendo triste. Não entendo vocês duas, não aprenderam nada comigo.
O telefone toca.
- Já tô indo. Vou trabalhar. Melhora essa cara. E vai fazer tuas coisas.
- Tchau. Mãe...

terça-feira, 22 de março de 2011

a uma anônima

Navegando por mares alheios, encontrei certa anônima que, comentando certo blog,  citou certo texto  que amo muito e que tem tudo a ver conosco (comigo e com a tal anônima). Segue abaixo o tal texto, segue abaixo o narrador de nossas vidas:

            LISBOA REVISITADA



NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço.  Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz!  Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

                              [Álvaro de Campos, 1923]



terça-feira, 1 de março de 2011

Breve diálogo sobre a sanidade

K: Entende agora o porquê da minha loucura?
M: Não, não entendo. A loucura é tua, não joga pra mim.







[Uma breve homenagem e uma declaração de saudade]

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Reflexões de ano novo

"(...) Hoje é o seu aniversário, e pode não ser o dia mais feliz do mundo, mas busque fazer com que os próximos sejam. Busque sabedoria que vem do alto. Procure soluções plausíveis e se não for possível não se abata. Brinque com os problemas e sorria. Encontre o amor que tanto deseja, se movimente e, por último, vá atrás dos seus sonhos. Não importa o que digam ou que falem, busque seus objetivos, mas somente os SEUS. Não deixe ninguém brincar com você. O melhor conselho que eu posso te dar é: Seja você mesma! (...)"
(Carta de aniversário - 14/01/2010)
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Porque hoje, com insônia, comecei a pensar na vida e constatei que meu ano está para começar realmente agora. Fui procurar coisas pra ler no computador e abri essa "carta" que meu namorado (na época, ex) me mandou no meu aniversário do ano passado, que, sem dúvidas, foi o pior que já passei.

Sem querer, comecei a fazer aquela retrospectiva que a gente costuma fazer no final do ano, mas que veio agora, porque lembrei que, antes da minha viagem de fuga, escrevi que estava com a leve sensação de que alguma coisa na minha vida iria mudar.

Pensando nisso, constatei que, realmente, em menos de quatro meses, minha vida mudou muito. O mais engraçado é que pros outros pode parecer que tudo voltou a ser como antes (e a sensação inicial, até pra mim, era essa mesma): Voltar pra casa, pro namorado, pra faculdade... Mas está tudo tão diferente, eu estou com a cabeça tão diferente, que a sensação é de que estou começando tudo novo, mesmo que de novo, como diz o Moska.

Olhei pra textos e fotos de um ano atrás e vi o caos estabelecido: 2010 também foi ano de coisas novas, pena que 80% delas muito ruins. Comecei o ano terminando um namoro. Fiquei mal. Fui excluída da igreja por falta de assiduidade. Larguei de vez. Conheci gente nova. Fugi pra uma cidade desconhecida, pra ficar na casa de gente desconhecida. Foi minha primeira viagem sozinha. Voltei. Fui pedida em casamento. Não aceitei. Enlouqueci. No meio disso tudo, fiz uma formatura fake, num momento que não podia ser pior.

Perdi a vontade, desanimei comigo mesma. Perdi a paixão pelo que mais fui apaixonada na vida: literatura e música. Fugi dos meus amigos. Tranquei a casa. Deixei os livros empoeirarem. Entrei em depressão.Emagreci. Entrei pra uma igreja que eu sempre critiquei. Desisti. Surtei. Fui pela primeira vez ao psicólogo. Não voltei. Larguei a faculdade. Cortei o cabelo. Viajei sozinha de novo. Pra fugir de novo e pra pensar na vida. Passei mais de um mês fora. Voltei pra casa. Voltei pros amigos. Voltei pro namorado. Tomei meu primeiro porre. Fiz mechas claras no cabelo. Daí 2010 finalmente acabou, graças a Deus, e que descanse muito bem longe de mim.

2011. Comemorei meu aniversário. Foi MUITO feliz. Tive a primeira crise histérica de TPM, quase provoquei um acidente. Fiz trilhas. Fiz a primeira viagem sozinha com o namorado, depois de anos. Voltei pra academia. Entrei pra um curso de revisores. Vou ser tia. Ganhei de presente do acaso uma cachorrinha linda. E agora estou voltando pra faculdade, mas mudei um pouco de área, tentando ser prática.

O ano começou e, realmente, mais do que "algo" mudou. Várias coisas em mim mudaram. Mudei meu jeito de lidar com algumas coisas. Sem perceber, acho que consegui seguir quase que piamente todos os conselhos da carta, no que tem de bom e de ruim, com os mesmos personagens (acho que o autor da carta não esperava por isso) e, basicamente, o mesmo cenário, porém, e aí está toda a diferença, com ângulos de filmagens diferentes.

Aí me lembrei de uma frase do Pessoa - para quem também voltei -, que já usei em outra ocasião, mas que, também, agora apareceu sob outras circunstâncias:
"A espantosa realidade das coisas é a minha descoberta de todos os dias".

Que venha 2011 e que seja bom. *faz uma prece*

segunda-feira, 19 de abril de 2010

O sentimento do mundo

Olhando nas ruas, assim, de repente, você se dá conta de que a sua tristeza mais particular, seu conflito mais pessoal e todo existencialismo de suas crises nada mais são do que a mesma dor de toda gente.



Ainda assim, é tudo só seu.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Rascunho 1

"Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco".

Os olhos suportam tudo
passivos de não mais querer
cientes do não mais haver
Os olhos alheios ao mundo
O mundo

Os olhos carregam o mundo
carregam o que não sobrou
a sobra que não ficou
Os olhos carregam o haver nos olhos

o haver das palavras não ditas
o destino das promessas esquecidas
Os olhos?
Os olhos não veem.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Meu lado mulherzinha

Quem não tiver, que atire a primeira pedra.

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Todo mundo se apaixona distraidamente. É coisa que não se decide e só é percebido quando já está em flor.

“Como você o conheceu?”

É a primeira pergunta da saga. Foi-se o tempo em que se tinha vergonha de dizer que conhecemos pessoas pela internet. Pode ser gastando horas entrando e saindo em salas de chat, visitando um perfil de Orkut por curiosidade, retribuindo um comentário que chegou no blog ou fotolog. Não importa tanto. Quer dizer, importa sim. Se foi muito por acaso, a apresentação ganha um peso mágico para os outros, inclusive para você, que conta como foi cheia de orgulho, dizendo que ele nem pediu o MSN logo de cara, como se isso fosse um baita sinal de respeito.

“Cê ta gostando dele?”

A resposta é sempre evasiva, um “Eu?! Nãao...” que não convence ninguém, sempre seguido de um “sei... e ele?”. Pronto. É uma verborragia sem fim. Todos os achismos e as benditas e traiçoeiras expectativas explodem na boca num fôlego só. Você cita cada mensagem de MSN, cada torpedo [não importa se ele era um resmungo sobre a vida ou algo que te diz respeito], cada ligação. Cada palavra é cuidadosamente [e geralmente erroneamente] analisada, decifrando querências que podem existir pro trás das virgulas. Sempre na defensiva, claro. É o nascimento e fixação dele no seu mundo.

“Como foi?”

Você pode contar de forma afobada, engasgando nas próprias palavras, cortando várias coisas que vai contar depois. Pode falar “foi per-fei-to” umas 50 vezes antes de começar a contar [ou no meio da estória... ou no fim... ou o tempo todo, o que é mais provável], fazendo aqueles sons estranhos que não são nem suspiros nem exclamações humanamente conhecidas. Gesticula feito uma doida, quase quebra o maxilar de tanto sorrir. Não sei como os meninos contam essas coisas [Se é que contam. Já ouvi um me dizer que o relato se resume a “To pegando uma mulezinha aí...”. Meninos... blé.]. Muitos acham um absurdo sabermos tanto umas das outras. Mas é fundamental! É como ler o livro depois de ver o filme. E é como conseguimos buscar melhor a aceitação/aprovação das melhores amigas. Sim, nós buscamos isso e o contentamento compartilhado é necessário. É o ele existir pacificamente no seu mundo.

“Já tem quanto tempo mesmo?”

Contam-se os segundos. Você pode vê-lo todos os dias, semanalmente ou quinzenalmente. Não importa. Ingenuamente a seriedade da relação [para você!] está ligada a quanto tempo a coisa vem acontecendo, como se fosse plano de carreira. Tenta definir o “o que ele é meu, afinal?” Ah, e, claro, obviamente você também quer saber o que é para ele, até onde vai na vida dele, se existe além da cabeça dele, como para familiares e amigos. Enfim, tudo que envolver os pronomes “você” e “dele” se torna alvo da sua desesperada, incontrolável, praticamente [praticamente é só um eufemismo] insana curiosidade. Mas é um ponto tão obscuro e temeroso pra se pensar que às vezes nem suas amigas sabem dos seus temores [Pode ser que você continue sendo “a mulezinha que ele ta pegando”]. Óbvio que não assumimos a dúvida, mesmo que todos saibam. Gritamos “Ele não é meu namorado! Eu não estou namorando!” com um desejo gigante de que fosse mentira. É a eterna e inútil autodefesa. A essa altura certamente você já pensa até em nomes para os filhos...

“Como vocês estão?”

A pergunta deveria ser “Como você está?” e a resposta oficial é “Indo...”. Para as amigas é “Na merda!”. Para as que têm a infelicidade de se apaixonarem pelos que têm problemas em deixar claro o que querem [É uma boa tática, sabe? Se ele não promete nada, você não pode cobrar nada. Coisas que nunca aprenderemos a fazer. A habilidade não vem no cromossomo X], esse é o ponto crítico. O celular vira um extensão do corpo. Temos alucinações auditivas; ouvimos o som de sms chegando, ou de um contato ficando online no MSN. Se é o caso de aguardar uma visita ou qualquer forma de comunicação prometida, emails são checados a cada 10 minutos, MSN a cada 5 e celular a cada 2. O tempo também pode ser medido em segundos, dependendo da gravidade da saudade. A parte incômoda é que você se torna extremamente improdutiva. O dia para. Até a respiração fica meio suspensa. É uma espera eterna pela hora que ele costuma ligar ou dar um mísero oi. Até lá a concentração nas coisas beira o zero. E quando ele não aparece, a saudade vira desapontamento que vira tristeza que vira raiva que vira ódio e a partir desse ponto você já adquiriu uma úlcera e nem se deu conta. Isso em milésimos de segundo - enquanto você se descabela, ele está estudando, trabalhando, rindo com os amigos, ensaiando, dormindo... fazendo qualquer outra coisa. Pode até estar pensando em você, mas nessas coisas a nossa mente doente nunca pensa, mais fácil [e mais provável] é que ele esteja se esbaldando na esbórnia nem lembrando de que você existe. Daí você pensa em tudo que quer dizer quando ele aparecer no tom certo pra mostrar a indignação, em como ele estragou seu dia. E quando ele aparece... instantaneamente o mundo volta ao lugar e você fica em paz.

“Decidiu o que?”

Se a coisa está empacada, você precisa ouvir isso daí algumas vezes pra ajudar. As variações de humor ficam mais constantes. Você chora com filmes de cachorros, comerciais de cartão de crédito ou de plano de saúde [como aquelas pessoas podem ser tão felizes?!]. Imagina como seria pedir uma definição, pensa em todas as respostas que ele pode dar e em todas as réplicas que você pode revidar. Jura que não vai chorar quando já está chorando convulsivamente apenas por pensar em como resolver a situação. Com um pouco de sorte, você pode constatar que fez uma tempestade numa xícara de café [copo de água é grande demais]. Sem sinal dela, bem... é chorar um pouco [mentira, você chora até secar] e entrar de luto em todos os espaços reais e virtuais, amaldiçoando a internet por ter trazido a tragédia pra sua vida, ainda com uma esperança estúpida de que ele vá acessar algum pedaço do seu mundo em ruínas e tentar te procurar. E depois de umas semanas, ou dias, com sorte, apertar o F5 para atualizar tudo e retomar a vida.

Por Cíntia Rodrigues - com a colaboração de Lívia Dias.

sábado, 2 de maio de 2009

Entre as vírgulas

"a saudade fará mais por nós dois que nosso amor e sua
desajeitada e irrefletida permanência"

terça-feira, 10 de março de 2009

Notas inconclusas

Juntei os pedaços de vida que ficaram espalhados pela casa desde sua partida. Uni aos caquinhos de mim e fiz um belo arranjo. Não é tão belo quanto aquele que você, num momento insano e estúpido, atirou pela janela,mesmo sabendo que era o meu favorito, que eu cautelosamente decorei ao longo de nossa convivência. Não é tão bonito. Meio desajeitado,eu diria.
Pensei em ir até o jardim, resgatar os pedaços mais belos daquela pequena ruína para juntar ao meu singelo arranjo e tentar dar-lhe mais cor. Mas o que tinha de mais bonito era justamente o que estava mais estilhaçado, infelizmente, nada vai colar.
Chorei. Tive raiva. Desisti do projeto.
Pensei no que iria fazer com aquilo, não podia jogar fora, simplesmente. Então peguei o desajeitado arranjo e fui colando os pedacinhos sobre seu retrato. No entanto, os meus pedaços não foram suficientes para encobrir de todo sua face, ficaram menos que a metade. Você levou muita coisa.
Foi então que resolvi ir lá fora buscar outros pedaços, novas cores para restituir aqueles caquinhos e concluir meu novo projeto.
Quem sabe, aos poucos, peça a peça, eu consiga apagar seu rosto por completo daquela moldura? Quem sabe não faça arte com minha preciosa sucata?
Pode ser que não fique uma figura plana e bem definida como a de antes, mas pode dar um bonito mosaico.

domingo, 8 de março de 2009

Considerações ortográficas

Para C.

Eu sou a personificação da dúvida mesmo e você tem razão quando diz que isso se reflete até em minha pontuação, que é povoada por interrogações, raras exclamações e inexistentes pontos finais. É, os finais são os mais incertos.
E o que dizer das reticências? Deveriam me libertar um pouco né? Mas não.. elas não seguem ad infinitum, como deveriam ser. Até elas ficam hesitantes entre o ponto final e o continuativo. Não seguem em frente, param no meio..

quarta-feira, 4 de março de 2009

Irracionalidade

É negar a fatalidade de tudo isso. É cegar a razão e tudo de óbvio que ela vê e ignorar tudo que ela põe na minha frente.É ter total noção do auto-boicote das decisões tomadas em nome de um sentimento estúpido e burro.
É tudo isso e um pouco mais...

Mas esse coração imbecil teima em sentir sua falta.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Sobre planos não cumpridos

Olha só, você nem me levou ao Jardim Botânico.



P.S. O caso Watergate continua não fazendo o mínimo sentido pra mim.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O outro lado da força

Vez em quando me aparecem umas ideias que eu mesma não consigo acreditar que surgiram da minha cabeça de mulherzinha ciumenta, sujeita seriamente a casos de insanidade e histeria. Pois então. Num desses surtos de vaga sanidade, pensei em te deixar livre. Rá! Como assim!?!
Pois é, livre, assim mesmo, soltinho pra poder passear no puleiro que der na telha, escolher o canal chato de futebol e, quiçá, até as companhias que bem lhe aprouver - sim, mesmo aquelas intragáveis, que se passarem na minha esquina correm grande risco de levarem uma pedrada sem nem saber de onde veio. Simples assim.
Aposto que não ia acreditar, hein? Devia até fazer uma pegadinha contigo dia desses. Ia ser engraçado ver sua cara de total descrédito comprovando o fato de eu ser irremediavelmente chata. Como assim a ciumentaobssessivocompulsivainsuportavelmentegrudenta vai te deixar correr solto assim?!?
Pois é, pensei. Do nada mesmo. Estava sóbria até, juro. Pode esperar que daqui a pouco chegam os homens de branco, é camisa na certa.
Mas, pensando bem, até que a ideia não é má, o que é mais espantoso ainda.
A verdade é que eu tenho que parar com essa mania torta de achar que você é meu. Fazer o que? Eu acho mesmo. Quer dizer, eu sei que não é, mas acho que devia ser. Devia estar na constituição.
Contudo, não se desanime, isso ainda pode acontecer. O mundo está mudando e do jeito que ele anda girando e o aquecimento global tem causado coisas que nem Freud explica, não seria tão impossível não.
Daí depois a graça vai ser te roubar das outras. Vai entender... coisa de gente doida.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Momento reticente.

As reticências são os três primeiros passos
do pensamento que continua
por conta própriao seu caminho.
(Mário Quintana)

Um dia decidiu.
Foi até o quarto. Abriu suas gavetas. Pegou. Colocou em cima da cama.Pôs-se a dobrá-los. Eram a única coisa que lhe seria necessária.Foi até o guarda-roupas e, pondo-se na ponta dos pés, pegou uma pequena maleta.Voltou à cama, abriu a maleta e delicadamente colocou seus sonhos ali. Um de cada vez. Sonho a sonho. Era o que tinha de mais precioso.Olhou em volta, sua cama, a mesa de cabeceira que tinha acabado de decorar, as pessoas queridas no mural. Seus livros...
Respirou fundo e partiu.
Não deixou recado. Não contou a ninguém. Explicações seriam inúteis, quem lhe entenderia naquele mundo?Partiu. Simplesmente.
Um dia, enfim, tomou coragem e decidiu. Ia visitar o horizonte. E foi.

(se este  tem fim, com iria até lá, quando iria voltar, reticências que vão chegar) 



segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O avesso dos ponteiros

Na incansável ciranda dos ponteiros, todo dia é sempre agora.
Tudo irritantemente igual. t-o-d-o d-i-a.
Os dias, sempre assim, nem quente, nem frios. Mornos.
Nenhum trovão, um relâmpago, um raiozinho sequer. Uma explosãozinha ali no jardim do vizinho. Nenhum abalo císmico.
Nada que venha a tirar só um pouquinhosinho o mundo do eixo. Nada.
Só o mesmo tic-tac, tic-tac, tic-tac, mesmo, tic-tac,tic-tac, tic-tac, sempre.
O relógio nesse momento parece a todo instante mostrar a fadigante rotina a qual estamos fadados: girar em círculos para todo o sempre. Sem parar e, ainda assim, sem sair do lugar. Aguardando o momento de não sei o quê, que indique a tão esperada hora H. (O que existe de tão bom que comece com h?). Entretanto, o ponteiro não pára. E apesar desse constante movimento, não chega a lugar algum. Só serve para dar a infeliz ilusão de que se está caminhando, afinal, o tempo passa - pelo menos é o que o inútil objeto parace querer dizer.

Arre! Que vontade de que haja um grande estrondo que quebre as malditas vidraças desse relogio e que me faça sair desse claustro. A fobia já me quer dominar.

(onomatopeia pra começar enfim a vida.)

A quem interessar possa


Decidi fugir da vida pública, inclusive da sua. [da minha também]
Cansei disso aqui. Quero mudar, nem que seja só um pouco,ou por pouco tempo, já que mudança só se chama assim enquanto não nos acostumamos com ela. Ou, como costuma ser no meu caso, enquanto tudo não volte ao normal.
Por isso decidi mudar de caminho. Mas só vou ali dar uma espiadela no que é que tem por trás daquela portinha ali. Vou pular apenas uma página deste livro - só para poder ver se vem algo ali - mas volto logo para ler de onde parei.
É que me acometeu uma incontrolável curiosidade. Não sei bem o que é, mas não importa. Vou estudar essa sensação nova que cá dentro está.
Não, não se preocupe, não saio para explorar o vasto e perigoso universo lá de fora, não iria sem você. A novidade é aqui dentro. Quase como se houvesse um estranho dentro de casa.
Vou dar um pulinho ali em mim. Tenho certeza de que tudo voltará ao normal, mas me permito experimentar este acontecimento.
Afinal, se for para viver o mesmo, que seja o de daqui a pouco.
Já volto. Me espera.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Little Miss Sunshine

Querida Miss Sol,

   Hoje o dia amanheceu chuvoso e lembrei-me de você. Lembrei de você e senti sua falta. Sim, parece estranho, mas mesmo para toda loucura existe uma louca explicação, aqui está: Hoje não teve sol e a noite não teve sonho, por isso minha saudade repentina de ti, querida companheira de vôos.

   Sabe, o mundo anda cada vez mais estranho. O que se ouve por aí é que há uma crise assolando as nações. Talvez seja esse o motivo de as pessoas andarem por aí cada vez mais sisudas, segurando seus bolsos, com os pés cada dia mais fincados no chão. Sabemos que Marx há muito previu tudo isso - ninguém lhe deu ouvidos -  e agora toda a gente é séria e enrugada. Quem sabe por isso eu, que, como dizem, nunca estive aí para a Hora do Brasil, me sinta cada dia mais desajustada com esse mundo. Daí a saudade.

   Senti falta de nossas conversas de botas batidas. De rir de suas histórias loucas, dos nossos contos-de-fadas falidos. De sua sadia insanidade, sempre tão frutífera. Do seu riso frouxo que te faz chorar e daquela ruguinha de estresse sempre quando dava tudo errado. Aliás, achar graça da sua mania desesperada de tentar controlar o mundo e de seu transtornoobsessivocompulsivo por espiadas no relógio de segundo em segundo é o que mais me faz falta.
   Miss, as pessoas nos acusam de irreais, mas talvez elas não saibam que, de repente, sejamos quem mais tem noção da realidade, tanto que fugimos dela, por ser pesada demais para o nosso insano anseio por mágica. Aliás, nós sempre preferimos a magia, não é mesmo? Seguindo Blanche DuBois sempre e sempre.
   E por falar em realidade, sinto falta também de solidarizar-me contigo sempre quando queria que tudo fosse diferente e feliz e aquela mesma te dava um beliscão para você acordar, saber do sono e, ainda assim, querer dormir, e me entender, quando eu também assim preferia. A espantosa realidade das coisas sempre te fez ter medo de tudo, mas de vez em quando você se permitia lançar-se no abismo e gozar da efêmera sensação do vôo, mesmo receosa das feridas da aterrissagem. Das discussões após as aulas de literatura e de, depois, entrarmos em acordo que a vida deveria ser assim,sim! E emburrarmos por ela, em vez da arte, imitar os piores programas de televisão. Aliás, você ter "saído" da minha vida acadêmica deixou a faculdade mais chata e tediosa, coisa de gente grande. Me sinto uma universitária, que horror.

    A rotina anda muito enfadonha.  Precisava de você aqui para me mandar parar de falar mal dela. (ah, claro, e me fazer rir e te chamar de louca por amar tanto essa chatice. Tão metódica!)

   Me faz falta sermos um grande paradoxo e esse ser o sentido. A verdade é que minha saudade de ti é por saber de sua singularidade. Concluo que a vida precisa pessoas assim, para me fazerem companhia enquanto você está ocupada brincando de gente grande.
 
   Talvez se houvessem tais pessoas, pelo menos uma hora no dia, os medalhões das bolsas mundiais não estariam gritando no telefone, e, sim, jogando papel picado no ar. Mas, aguardemos nosso carnaval chegar, porque eu sei. Sei que um dia, querida amiga, o mundo viverá de magia. E nós, deusas coroadas, governaremos soberanas.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O outro lado do mundo

"mais vasto é meu coração".
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Eu queria mesmo era ser de outro mundo.
Viver de nuvem e andar de sonho.
Pensar impossíveis e fazer sentido.
Ou não fazer, e isto sê-lo
eu queria mesmo.
Pedir fantasia e se chamar realidade
Sem beliscões para o retorno a si;
Sem gente chata, sem gente séria;
Sem mal-amor, sem mau-humor.
Nem frieza, nem frescura.
Queria ser.
Sem medo do ridículo, profano,piegas,
de estar sendo cega;
Sem medo do medo, medo de tudo, medo do mundo;
Sem medo do riso frouxo, largo.
Sim, ser frouxo, ser solto
só ser.
Sem caçadores para atirar nas asas dos pássaros.
Sem métrica. Os versos? Brancos e livres.
Ser leve e poder sustentar
[ser de outro mundo]

Ser Alice, Emília,ser Chicó¹.
E ficar sendo, e ser, e só.

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¹ O auto da compadecida, Ariano Suassuna.